- Deus espera que você compreenda e aprecie poesia.
Esta não é uma declaração tão polêmica quanto parece. Sabemos que Deus espera que compreendamos e apreciemos poesia porque cerca de um terço da Bíblia está em forma poética. Para começar, temos livros poéticos como os Salmos e os Cantares de Salomão. Depois, temos os livros proféticos, em que grandes porções são expressas de forma poética. Além disso, há o livro de Apocalipse, vazado sobretudo em imagens e símbolos. E, ademais, as epístolas estão saturadas de imagens e metáforas.
- Jesus é um dos poetas mais famosos do mundo.
Como Jesus nunca se proclamou poeta, não costumamos pensar nele como tal, mas esta é uma omissão. Os discursos de Jesus valem-se muitíssimo da linguagem poética: “vós sois a luz do mundo”; “eu sou o pão da vida”. Adicionalmente, os ditos de Jesus são altamente aforísticos, e a beleza verbal é um elemento eminente da poesia. Assim, se começarmos com o fato de que os discursos e os ditos de Jesus estão entre os mais famosos do mundo, e acrescentarmos nossa consciência de que essas declarações são altamente poéticas na forma, é apropriado pensar em Jesus como um poeta famoso.
- A poesia requer “leitura lenta”.
As duas declarações anteriores pretendiam conquistar uma recepção inicial favorável para a importância da poesia na vida cristã, e mais se seguirá, mas todo esse elogio será infrutífero para aqueles que jamais adquiriram a capacidade de ler poesia. A regra mais importante para ler poesia é simples: a poesia requer uma leitura lenta e meditativa. Isso não significa negar que outras técnicas de leitura precisam ser acrescidas à caixa de ferramentas das habilidades de leitura de poesia, mas qualquer um pode compreender poesia ao refletir sobre um poema e viver com ele por dez ou quinze minutos em vez de submetê-lo à leitura rápida que faz parte de nossa vida diária.
Poesia é um modo de pensar e sentir antes de ser uma forma de falar ou escrever.
4. Todos são poetas em algum momento.
Essa, tampouco, é uma declaração revolucionária, mas, em vez disso, é algo facilmente comprovado. Todos fazemos poesia inconsciente ao longo do dia. Falamos metaforicamente do nascer do sol embora saibamos que ele não nasce de modo literal. Quando alguém faz uma oferta conciliatória, nos referimos a ela acenar um ramo de oliveira, mesmo sabendo que nenhum ramo de oliveira esteja à vista. Por que insistimos em falar metaforicamente? Porque num nível inconsciente sentimos que o discurso poético transmite a verdade efetivamente, e muito mais efetivamente do que a prosa literal.
- A poesia não é uma forma artificial de discurso.
A poesia não é nosso modo normal de falar e escrever, mas é importante afirmar que não é um modo artificial de discurso. Na história da literatura, a poesia antecedeu a prosa como forma consumada de escrever na maioria das culturas. O erudito literário Northrop Frye perguntava com razão: “Como isso poderia acontecer se a prosa fosse realmente a linguagem do discurso ordinário?”. Além disso, como particularmente defendia Owen Barfield, a maioria das palavras em nossos dicionários começou como imagens concretas e metáforas. Mais uma vez, não seria este o caso se a poesia fosse inerentemente artificial como modo de falar.
- Poetas falam uma linguagem própria.
O sentido das cinco afirmações anteriores é fazer a poesia parecer acessível e familiar. Este é um retrato inteiramente preciso da poesia. É acessível quando a abordamos do modo correto. Entretanto, não se ganha nada ao negar o fato óbvio de que a poesia difere da prosa cotidiana. Poetas falam num idioma poético. Esse idioma consiste primeiramente em imagens e figuras de linguagem. Poetas preferem o figurativo ao literal como modo de expressar a verdade sobre a vida.
- Poesia é uma forma de lógica.
Uma coisa que a poesia compartilha com a linguagem do discurso cotidiano é que é uma forma de lógica. A lógica depende de estabelecer relações precisas entre duas coisas. O poeta moderno Stephen Spender escreveu um ensaio memorável chamado “A formação do poema” no qual afirmou que “o desafio apavorante” que o poeta enfrenta é: “Será que consigo pensar sem a lógica das imagens?”. Na lógica da poesia, as imagens do poema hão de ser certeiras para encarnar as experiências retratadas. As comparações que constituem muito do idioma poético têm de ser comparações precisas. Se o luto com a morte de um ente querido é “a hora da passagem”, precisamos ser capazes de ver a precisão do vínculo.
8. Poetas pensam em imagens e figuras de linguagem.
Poesia é um modo de pensar e sentir antes de ser uma forma de falar ou escrever. Poetas escrevem num idioma poético porque é assim que experienciam a vida e a registram. Precisamos reconhecer os poetas que possuem uma habilidade ausente na maioria das pessoas.
- A poesia é concentrada.
Uma das coisas que um poema busca é ser compacto. Como observado acima, isso quer dizer que não devemos ler um poema o mais rápido possível e seguir para nossa próxima atividade. Em vez disso, a compactação da poesia é o que exige de nós uma leitura lenta. Quando o fizermos, ficaremos maravilhados com o quanto um poema expressa num espaço compacto. C. S. Lewis falou das delícias linha a linha que a poesia tem. Ela oferece muito mais por linha do que a prosa. Isso faz parte de seu apelo, mas somente se aceitarmos a premissa da leitura lenta e contemplativa.
10. A poesia é altamente artística.
Os próprios poetas reivindicam a beleza como seu território. Robert Frost chamava um poema de “uma performance em palavras” – uma performance comparável à do atleta ou do músico, admirada como exibição de habilidade. O poeta devocional vitoriano Gerard Manley Hopkins disse que a forma artística de um poema existe “por si mesmo e por seu interesse até mais do que o interesse de seu significado”. O corolário é que, como leitores, precisamos valorizar a beleza artística da poesia.
Leland Ryken
Leland Ryken (PhD, University of Oregon) atuou como professor de Inglês no Wheaton College por quase 50 anos. Escreveu ou editou mais de cinquenta livros, incluindo The Word of God in English e A Complete Handbook of Literary Forms in the Bible. É preletor frequente das reuniões anuais da Evangelical Theological Society e serviu como estilista literário da English Standard Version Bible.
Tradução de William Campos da Cruz
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